Vinte e cinco anos depois de renunciar à Presidência, numa tentativa desesperada de escapar do impeachment por corrupção em seu governo, Fernando Collor de Mello está de volta à disputa sucessória. Ele afirma que vai pôr novamente sua candidatura na ruas, na tentativa de repetir a vitória surpreendente de 1989. O ex-governador de Alagoas, hoje senador pelo PTC de seu estado, aposta suas fichas na memória curta do povo brasileiro. Pode até ser curta, mas não tanto quanto ele pensa. Ainda estão vivos na cabeça de várias gerações o despreparo e a prepotência de Collor — e também a rede de corrupção que seus asseclas montaram.
Quem aparenta apresentar lapsos de memória é o candidato do PTC, partido com origem no PRN, pelo qual Collor se elegeu à Presidência. Em entrevista após o anúncio de sua pré-candidatura, na sexta-feira 19, em Arapiraca, agreste de Alagoas, ele usou um argumento tão falacioso quanto o de “caçador de marajás” que o tornou famoso. “A experiência vai contar muito na avaliação do eleitorado brasileiro. Ele não quer ser mais vítima de surpresas, do inesperado, do desconhecido, de algo que já verificou que não dava certo. Vai desejar candidatos que tenham experiência e compromissos sociais”. E apresentou-se como o candidato com esse perfil.
Mas será que seu discurso ainda vai convencer alguém? Experiente Collor é, mas foi responsável por experiências desastradas. A história está aí para provar. Ele foi o primeiro presidente da República na história do País a sofrer um processo de impeachment. Seu governo ficou marcado pelo bloqueio irresponsável da poupança dos brasileiros, numa tentativa torta de combater a inflação. E também pelo esquema de corrupção, a cargo do amigo e tesoureiro de campanha Paulo César Farias, o PC, que pagava as despesas do presidente com dólares pagos como propina por empresas que mantinham contratos com o governo. O esquema funcionou tão bem que o grupo liderado por PC Farias chegou a desviar o equivalente a US$ 1 bilhão. Até que veio a público o caso do Fiat Elba usado pela primeira-dama Rosane Collor, comprado com cheque fantasma de José Carlos Bonfim. Na verdade, quem assinava era o piloto Jorge Bandeira, sócio de PC Farias. Outra denúncia avassaladora: a reforma dos jardins da Casa da Dinda (residência de Collor), orçada em US$ 2,5 milhões, fora bancada com dinheiro de contas fantasmas administradas pelo então tesoureiro de Collor.
O castelo ruiu de vez com o depoimento do motorista Francisco Eriberto Freire França, publicado por ISTOÉ. Ele contou que havia uma conta no banco comercial Bancesa onde PC Farias depositava propina para seu amigo presidente. Quem movimentava era Ana Maria Acioli Gomes de Melo, secretária de Collor. Com o dinheiro sujo, ela pagava salário dos motoristas, contas de água e luz da Casa da Dinda e funcionários. A partir daí, o governo Collor naufragou. Até seu partido o traiu. Dos 28 deputados do PRN, 18 votaram pelo impeachment. Por 441 votos a favor contra 38, a Câmara autorizou o Senado a abrir o processo. Ele foi afastado do cargo. Em 29 de dezembro de 1992, renunciou, mas o julgamento prosseguiu. Ele foi considerado culpado de crime de responsabilidade e impedido de exercer cargo público por oito anos. Em dezembro de 1994, o STF absolveu Collor das acusações de corrupção passiva, mas ele continuou inelegível. Após recuperar os direitos políticos, disputou o governo de Alagoas em 2002. Foi derrotado. Somente quatro anos depois conseguiu uma vaga no Senado. Reeleito em 2014, voltou a incorrer em crimes de corrupção, obtendo vantagens de empreiteiras que desviaram recursos da Petrobras. Segundo o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, Collor recebia mesada em contratos da BR Distribuidora. O processo tramita no STF.
Acredita-se que a candidatura de Collor faz parte de uma estratégia para ajudar seu pequeno partido, atingido pelas regras que restringem o acesso ao Fundo Partidário e à propaganda gratuita no rádio e na TV. Em 1989, Collor derrotou Lula no segundo turno. Agora, o País assiste às pré-candidaturas de um Lula condenado pela Justiça e de um Collor que renunciou por denúncias de corrupção. Mais do que nunca vale o famoso ditado: a história só se repete como farsa.
ISTOÉ
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