Por Franklin Willame Oliveira
Nos últimos 10 anos, Guamaré recebeu R$ 202 milhões em royalties pela exploração de energéticos petrolíferos em seu território. Numericamente, é 20ª PIB do País: R$ 90.230,00, o triplo da renda paulistana, segundo reportagem especial da revista Exame que chegou às bancas neste fim de semana e que mapeia a festa com royalties em alguns municípios do Brasil e se detém longamente sobre a cidade potiguar.
Guamaré tinha tudo para ser próspera. Além de poços de petróleo, tem três parques eólicos, um terminal aquaviário, duas usinas de biodiesel e uma refinaria da Petrobras, afora praias perfeitas para o turismo.
Também nos últimos dez anos Guamaré trocou de prefeito oito vezes. O Tribunal de Contas do Estado deu parecer contrário à prestação de contas de três deles. Um foi preso por desvio de verbas. Neste momento, o Ministério Público investiga os gastos com festas dos dois últimos prefeitos. Auricélio Teixeira precisa explicar os 785 000 reais pagos a bandas no Carnaval de 2011. O atual prefeito, Emilson Borba Cunha, tirou do caixa 2 milhões de reais para animar o Carnaval deste ano e mais 2,2 milhões para bancar o oba-oba no aniversário da cidade, ao som das vozes de Zezé di Camargo e Luciano, Fábio Jr. e Reginaldo Rossi.
Enviada especial à cidade, Patrícia Ikeda relata a contrariedade de Guamaré: A prosperidade não passa de um efeito contábil, fruto da divisão de um PIB turbinado por uma pequena população de 12 000 habitantes. Não muito longe do centro estão comunidades como o Morro do Judas, um bairro com ruas de terra, sem água, luz e esgoto. Os moradores, como o agente de saúde Raurison Souza, precisam fazer gambiarras para garantir o mínimo de água em casa.
A Petrobras chegou à cidade em 1982, mas até hoje a maior parte da população não tem qualificação para aproveitar as centenas de vagas abertas no setor de energia. Enquanto as empresas de petróleo importam trabalhadores de outros estados, um quarto da cidade trabalha na prefeitura, os analfabetos representam mais de um quinto da população (o dobro da média brasileira) e quase 10% vivem na extrema pobreza.
O único local onde os moradores poderiam obter alguma qualificação é no pequeno centro técnico do município, que oferece apenas 68 vagas em três cursos.
Lucas Fenix de Oliveira, de 22 anos, até tentou entrar lá, mas não conseguiu. Como as vagas são restritas, a escola não aceita que duas pessoas da mesma família estudem ao mesmo tempo. No caso de Oliveira, deram preferência ao irmão mais velho. Mas ele não desistiu de melhorar a formação.
Após o trabalho como monitor ambiental numa fundação, faz bicos em um supermercado e usa o dinheiro para bancar o curso de eletrotécnica, na cidade vizinha. O que prospera em Guamaré é o assistencialismo. Um total de 2 300 famílias recebe da prefeitura um cartão com 120 reais para gastar no comércio. Outras 267 estão no programa de auxílio-aluguel. Há ainda 1604 beneficiadas pelo Bolsa Família.
Morando à beira do rio Aratuá, que contorna Guamaré, o pescador Toninho Fonseca e sua mulher acompanharam a transformação da terra natal nos últimos 30 anos. Criaram cinco filhos com a renda da pesca, a principal atividade da cidade antes da chegada da Petrobras. O que mudou para eles? O casal agora pode observar a cidade mais do alto, pois a casa ganhou um segundo piso erguido com restos de materiais abandonados por empresas. “O dinheiro que corre por aí não chega aos filhos de Guamaré”, diz Fonseca.
Guamaré em dia
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