Por Pablo Capistrano*
Não sei você, amigo velho, mas eu dei uma olhada nas fotos roubadas de Carolina Dieckmann, que foram jogadas na rede essa semana. Mas não olhei apenas porque Carolina é linda (uma evidência); por ela ser famosa (um fato) ou de ela ser uma boa atriz (uma probabilidade).
Apenas esses indícios não explicam a histeria viral em torno das fotos de Carolina na rede. Com tantas mulheres nuas pela internet, com tanto sexo e tanta pornografia amadora, para todos os gostos, todas as taras, todas as práticas e fantasias possíveis disseminadas pela fantasia humana, o que poderia produzir a exposição de mais um corpo feminino no mundo do voyeurismo virtual?
O que moveu o Brasil em sua busca pelas fotos roubadas de Carolina foi a saudade. Uma longa e sufocada saudade. Uma estranha e recalcada nostalgia da verdade que, de vez em quando, desponta como um aviso, uma lembrança, um sintoma, nesses tempos de alienação e exclusão. Nessa era em que apenas um simulacro do mundo nos é facultado.
A verdade sobre o corpo da atriz; a verdade sobre a alma da mulher que se prepara todo dia para ser vista pelo mundo. A verdade que parece ter abandonado um horizonte cheio de realidades paralelas que, de tão simuladas, de tão projetadas na tela de nossas ideias, de tão brilhantes, coloridas, proporcionais e higiênicas, não são mais sentidas.
Emanuel Lévinas, o filósofo judeu acusado pela esquerda pós-moderna de ser mais um sexista reacionário , dizia que toda conquista sexual masculina é fadada ao fracasso. Nunca, nenhum homem, em nenhum momento da história, reteve o feminino que ama esconder-se pelo corpo e pela alma da mulher. Por mais que o homem tente submeter sexualmente uma mulher, ele nunca, na leitura de Lévinas, vai atingir o centro de seu próprio desejo. Porque o feminino absoluto que o homem deseja se esconde quando o buscamos, e só se mostra, quando distraídos, pensamos que não o temos mais.
Mas, se isso era assim no tempo do mundo (o desejo louco pelo corpo do outro, pela verdade da carne) nesses tempos virtuais, se soma a náusea sem fim que a pornografia em rede causa àqueles que já superaram a fase do onanismo militante.
São tantas imagens de corpos, amigo velho, tantas damas preparadas pelo cosmético eletrônico, tantos rostos se contorcendo de um prazer abstrato e fantasmagórico, que não há mais espaço para a irregularidade da vida, para o cheiro biológico do sexo alheio, para a tessitura do toque feminino que nenhum computador consegue reproduzir.
Por isso, é preciso simular o acaso, apostar no amadorismo, torcer para que as fotos da atriz não tenham sido projetadas para as redes, para as realidades virtuais do grande cérebro coletivo que nos pensa e nos rapta em seus fragmentos fluidificados.
Sim… queremos Carolina. Mas não a Carolina da tela da TV, a Carolina da foto do estúdio, a Carolina do Facebook, do twitter. Precisamos de alguma verdade sobre o corpo daquela mulher. Alguma verdade que nos traga de volta a fascinação fundamental por aquilo que ama se esconder, que não se reduz a uma imagem, que não se submete a um signo, que não se traveste em uma ideia.
Que escapa da fantasia monstruosa feita de retalhos que as vezes a Internet parece ter se transformado. Nessa época de simulacros, aspiramos por aquilo que nunca se reduz, nem se entrega; por aquilo que foge quando olhamos; que dissuade quando tentamos reter.
Se existem bilhões da Carolinas reais, em suas teias virtuais, construídas pelo esforço fragmentário da grande maquinaria da mente computacional; Carolinas que se duplicam em velocidade viral, que são vistas pelo intermediário frio de nossa neblina de signos, o que nos sobra é só esse desejo por um pedaço de verdade que nos ajude a escapar desse resíduo de real que se tornou a vida.
Nessa rede de imagens descoladas e de fantasias semióticas, queremos a verdade, mesmo que seja estranho; mesmo que seja bizarro, bizarro. (*PC, no blog www.pablocapistrano.com.br)
FONTE: Por: Alex Medeiros
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